quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Mudança: os ricos também delinqüem

Jadson Oliveira
Viva, viva! Felicitações aos editores de A Tarde de hoje, dia 11, que lascaram duas fotos (não consegui ler o nome do fotógrafo na edição eletrônica) na primeira página, denunciando a escandalosa discriminação a que ainda estão submetidos os pobres no Brasil, sob o título: “Duas prisões, uma humilhação”.

Uma foto mostra a prisão de um advogado acusado de envolvimento com a suposta venda de sentenças no Tribunal de Justiça da Bahia. E a segunda é a de uma mulher de aparência modesta.

Reparem os contrastes:

1) O advogado foi preso em Cidade Jardim e a mulher em Engomadeira;

2) Ele está bem vestido e ela meio desarrumada, inclusive descalça;

3) Ele, com aparência confiante, olhando para frente, e ela cabisbaixa;

4) Ele está seguido por um policial sem armas na mão, enquanto ela está ladeada por dois policiais, um empunhando uma pistola e o outro agarrado com as duas mãos numa arma maior (uma metralhadora?), aparentemente prontos para o combate iminente;

5) E, detalhe fundamental, o advogado está sem algemas, enquanto a moça de Engomadeira está algemada.

Fundamental porque, ultimamente, houve um tremendo rebuliço entre as elites de nosso país, indignadas com essa mania ultrajante da Polícia Federal de algemar ricos, pessoas de bem, geralmente brancas. Só porque estariam envolvidas nos chamados crimes de colarinho branco? Por uma simples suposição? Claro que haveria provas, gravações de conversas telefônicas devidamente autorizadas por juízes, os tais enriquecimentos inexplicáveis e inexplicados. Mas mesmo assim... Onde já se viu um desrespeito tal? Nem no tempo da ditadura!

E a santa indignação atingiu o auge quando um par de algemas acabou nos pulsos do poderoso banqueiro Daniel Dantas. Aí foi um Deus-nos-acuda! Mas a reação dos representantes da parte sã (ainda há, graças a Deus!) da nossa sociedade veio rápida e forte. Sob a liderança do ínclito presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, uma cruzada em defesa da moral e dos bons costumes recolocou as coisas nos eixos.

Se temos de prender ricos, que pelo menos o façamos dentro dos estritos parâmetros da legalidade e da decência, ou seja, sem as infamantes algemas. Já os pobres, ah! Os pobres!...

As carcomidas elites brasileiras devem morrer de saudades dos velhos tempos, quando os senhores ricos eram intocáveis. Me lembro de uma passagem de um filme brasileiro, de 30, 40 anos atrás (falta grave, não sei o nome do filme, nem o nome de seu diretor). Um cabo da polícia, mulatão, entra com sua patrulha numa boate e ordena a revista dos freqüentadores, gritando: “Primeiro os mulatos, primeiro os mulatos”. Em seguida, começa a conversar com os garçons e solta esta pérola: “É... eu sei que os ricos também delinqüem. Mas aí não é problema da polícia!” A frase é acompanhada por uma gesticulação, como se dissesse “afasta de mim esse cálice...”Bons tempos!


Parabéns aos editores de A Tarde. Numa hora destas (infelizmente cada dia mais raras), volto a ter um certo orgulho de ser jornalista (mesmo aposentado).

7 comentários:

VADO ALVES disse...

Meu grande amigo Jadinho, felicitações petistas/lulistas, e meus
parabéns ao Diabo Loiro de Seabra,
seu blog ta maravilhoso!!! Fico muito feliz ao te ver na ativa e com todo gas.

Hoje tive a felicidade de ler comentário seu, neste espaço, a respeito da primeira pagina de A Tarde. Jadinho, posso te garantir que a ousadia de fazer tal denuncia contou também com sua participação, e ela começou há duas decadas, na redação da velha Tribuna quando juntos fazia-mos a primeira pagina. Estou a 10 anos aqui em a tarde e a 8 como coordenador de arte fechando a primeira pagina. A ideia de fazer o contra-ponto com as fotos nasceu da minha cabeça e contou com total apoio do secretário de fechamento Paulo Oliveira, que por sinal é cheio de manhas como você, mas tambem um exelente profissional e com os mesmos ideais que os nossos.

Grande abraço,
Ps. quando terei o prazer de novamente sentar a mesa a seu lado e degustar uma loira bem gelada? Quando poder é só ligar.

Vado Alves
E-mail: vado.alves@gmail.com
tel.: 99729543 / 91269606 / 33408644

Joana D'Arck disse...

Grande Vado! Tinha que ser você o autor dessa edição com tanta sensibilidade.Fiquei duplamente feliz, aliás triplamente feliz: pela edição, pela autoria e pelo comentário de Jadson.Parabéns! Abraço.Joana.

Crisóstomo disse...

Meu querido Jadson, vc foi ao ponto, que a imprensa precisa repisar. O Judiciário se não me engano deu um jeito de atribuir o ensejo de seus cuidados anti-algemas ao caso da prisão de um pobre. Mas,independentemente de ter sido esse o gancho IMEDIATO ou não, independentemente dessa alegação (não é preciso pôr isso em dúvida), o contexto aponta para outra coisa. Foi preciso prender um representante da elite econômica, mais precisamente financeira, alguém com notória influência sobre poderes da república, para que a trombeta desse "direito humano" atingisse, por cima de toda uma realidade de desrespeitos tranquilamente tolerados, os casos minoritários das figuras ungidas. Observe-se que nem prisão de político suscitou essa reação defensiva, o que sugere que o poder pessoal mais alto é de representante ('influente') da elite econômico-financeira. O juiz espanhol que mandou prender Pinochet, este juiz, sim, um embadeirado dos direitos humanos e individuais, disse claramente: Na Espanha, a decisão sobre algemas é da polícia. Pessoalmente, acho que, independente do que se diga, até pela sua (in)aplicabilidade, essa medida anti-algemas merece ser chamada de 'cuidado anti-algema para colarinhso brancos' - claramente. Produzida sob medida pela alfaiataria do casuísmo judiciário elitista, elitismo contra o qual ainda haveremos de avançar muito, sem nenhum arranhão no Estado de Direito; ao contrário, fazendo com ele seja o mesmo Estado para todos. Só faltou o judiciário dizer que, para colarinhos e punhos brancos, a polícia poderia usar apenas, em lugar de algemas, abotoaduras de prata. De minha parte, sugeriria algemas Armani. Mais do que justo.

Mônica Bichara disse...

Vado, que surpresa! Parabéns pelo saque. A capa foi o comentário do dia (ontem) entre jornalistas. Gostei da lembrança dos tempos de fechamanto da capa da TB na "gestão" Jadson Oliveira. Vocês mandavam bem pra caramba, mesmo, e produziam capas inesquecíveis, históricas. Chega de mesmice e de manchetes óbvias. Vamos exercer o nosso "poder" (pelo menos esse ainda temos) de cobrar avanços na nossa tímida democracia. E se está provado que os ricos também delínqüem, como bem disse Jadson, então um bom começo é exigir tratamento igual, com algema ou sem algema.

Jadson disse...

Pois é, Auriosvaldo (este é o nome no cartório do nosso querido Vado), fiquei lisonjeadíssimo com o seu comentário. Me emocionei diante de suas palavras relembrando os velhos tempos da redação da Tribuna da Bahia, uma convivência realmente fraterna e rica, apesar das dificuldades, das limitações. Mas não tinha problema, logo em seguida ao fechamento fazíamos a festa no Abaixadinho, com direito a uma esticada no Alagoano, na velha Sete Portas. Que saudade, companheiro!
Que bom que seu talento e sensibilidade encontraram espaço em A Tarde, o flagrante das duas fotos (de autoria de Arestides Baptista, vi depois) foi mesmo genial, parabéns de novo ao “coordenador de arte” (melhorou muito, nos tempos da Tribuna era simplesmente diagramador, mudam os tempos, mudam as palavras), extensivos ao companheiro Paulo Oliveira.
Vamos nos falar e acertar pra tomar uma. Um grande abraço.
Jadson
PS 1 - A propósito de “os ricos também delinqüem”, aproveito para recomendar a leitura de entrevista do ministro-chefe da Controladoria Geral da União a Bob Fernandes, de Terra Magazine. Título: “Jorge Hage: lei atual não manda rico para a cadeia”. Esclarecedora, diz que às vezes rico é preso, mas não fica preso. Hage é juiz aposentado.
PS 2 – É isso aí, companheiro Crisóstomo. A prisão de um representante do capital financeiro mostrou claramente onde está o poder de fato.

Jadson disse...

Sobre “Mudança: os ricos também delinquem”, Goiano, batizado como José Donizette, enviou a seguinte mensagem aos amigos e companheiros do Projeto Velame Vivo, movimento social que vem fazendo belo trabalho em Velame/Seabra/Chapada Diamantina:
“Companheiros (as),
fico feliz em encaminhar essa matéria para vocês, escrita pelo nosso querido Jadson Oliveira, excelente.
Gostaria de aproveitar a oportunidade e vender um pouco o peixe destes nobres jornalistas que criaram um blog para criticar a mídia baiana, eles são pessoas comprometidas com a história e o que se escreve, bem, peço para que vocês acessem ao blog www.anossamidia.blogspot.com, lá encontrarão boas matérias.
Saudações,
Goiano”.
Valeu, companheiro.

Sobre o mesmo assunto, registro que A Tarde, na edição de sábado, dia 13, deu ampla matéria revelando que a dona-de-casa Fabiani Figueiredo, que foi humilhada pelas ruas de Engomadeira – fato denunciado pelo mesmo jornal e abordado por Mídia Baiana – é, de fato, inocente. Tal circunstância acentua ainda mais a diferença de tratamento dado pela polícia no seu “relacionamento” com ricos e pobres. Seria ótimo que a nossa mídia ficasse sempre atenta a esta realidade.
Jadson

Anônimo disse...

La ringrazio per intiresnuyu iformatsiyu