quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Lugar de repórter é na rua

Joana D’Arck

Interessante o comentário de Carmela Talento sobre a cobertura atual da campanha eleitoral, relembrando os tempos de redação em que “cada repórter era designado para acompanhar um candidato. Produziam-se matérias diferentes, entrevistas exclusivas que davam uma dinâmica às campanhas”.

Hoje não tem mais isso de freqüentar comitês em busca de informações junto aos coordenadores de campanha, lideranças dos partidos e militantes, acompanhar agenda dos candidatos, exceto em um evento ou outro (e nesse caso somente A Tarde e a TV Bahia, quem diria, têm feito alguma cobertura presencial), fazer entrevistas exclusivas tentando extrair algo de novo, mais espontâneo, que leve um pouco de realidade para o leitor, porque publicar somente os programas de governo dos partidos tem muito mais de ficção do que qualquer outra coisa.

Os tempos agora são outros Carmela, diriam uns. Os repórteres sumiram dos comitês e dos eventos e invadiram as caixas de e-mails das assessorias de imprensa. Querem respostas na medida certa (com total de caracteres, corpo e tipo de fonte definidos e tantas exigências que assessores têm a sensação de fazer parte das equipes de redação).

É tempo de cobertura virtual, provavelmente (creio que na maioria dos casos) buscando vencer o desafio de cumprir inúmeras pautas diárias (os veículos têm reduzido cada vez mais o número de profissionais e os que permanecem são sobrecarregados e deslocados para coberturas de áreas distintas, enquanto funções públicas e empreendimentos privados já não podem prescindir das assessorias de imprensa) e isso exige uma discussão muito mais ampla.

Voltando ao tempo bem lembrado pela companheira, nem tão distante assim, os repórteres não davam trégua para os candidatos, acompanhando de perto a evolução e o acirramento das campanhas. Coordenação política, assessoria jurídica, sessões do TRE, empresas de produção de material de campanha, agências de publicidade, ninguém escapava do exercício comum de buscar algo de novo e especial para o leitor, além do programa de governo bem feitinho exibido no horário eleitoral.

O fato é que a cobertura jornalística mudou, sim. Não há dúvida de que ganhou com ferramentas tecnológicas que agilizam a busca da informação (internet e celular), mas exige uma reflexão quanto à busca da notícia em suas várias versões e na visão propriamente dita do repórter. Nunca é demais repetir as palavras de ordem da competente Carmela Talento em seus bons tempos de redação orientando a equipe de política da Tribuna da Bahia: “Lugar de repórter é na rua”.

Joana D’Arck
DRT-BA 1280

3 comentários:

Mônica Bichara disse...

Isso mesmo, Jô. Lembrar a editoria de política da TB, chefiada por Carmelinha, é uma delícia. Quando a gente só faltava enlouquecer com tanto corre-corre, ela chegava e perguntava: "Vai chorar, Mané?". E todo mundo ria. Ou chorava, mesmo.

Mas, como você colocou, a gente ia pra rua mesmo, acompanhar os bastidores, cavar informações diferentes e conquistar a confiança das fontes.

Parece mentira, mas outro dia um repórter de jornal ligou para a Assessoria da Câmara querendo saber os nomes dos vereadores que empregavam parentes nos gabinetes. Só posso imaginar que ele queria furar a pauta e estava fingindo para o editor que estava apurando. Me poupe! A criatura queria um release com a relação dos nomes (kkkkk)
Uma matéria dessa tem que ser fruto de muita investigação. Mesmo porque não basta comparar sobrenome. Cito meu caso: quando fui assessora da bancada do PCdoB, morria de medo de uma matéria desse tipo porque um primo de meu pai, Antônio Bichara, era vereador (da base carlista, é bom frisar) e eu não tinha o menor contato com ele. Mas, com um nome desse, quem ia dizer que não era troca de favores? Mesmo entre carlistas e comunistas.
Por essas e outras que o repórter tem que saber separar o que é informação que pode ser solicitada a uma assessoria e o que é obrigação dele ir à luta para descobrir. O problema é que os veículos passaram a utilizar as facilidades proporcionadas pelo avanço tecnológico como uma ferramenta apenas para reduzir custos, principalmente com o enxugamento das equipes. pensam assim: "já que ficou mais fácil apurar, vamos demitir e botar os que ficarem para trabalhar mais". Esta semana perguntaram na Câmara até o papel dos vereadores e se eles batem ponto kkkkkkkkkkkkkkk
Mônica (Reg. 954 DRT/BA)

Carmela disse...

Vocês estão certas, o exercício do jornalismo virou uma função burocrática. Mas outra coisa tem chamdo atenção no noticiário das eleições que é a utilização sem limite do off. As últimas notas publicadas nas mídias, principalmente nos bolgs, sites e colunas de jornais impressos, sem identificar a fonte é o que há de mais sórdido na política e na imprensa nesse momento. Uma avalanche dessas publicações tendo como referência ¨uma fonte que não quis se identificar¨, uma fonte ¨próxima ao Palácio Thomé de Souza¨, e por ai vai, são postadas diariamente demonstram a desqualificação do debate político. Ninguém quer mais se identificar, o que é muito estranho. Ou os jornalistas estão sendo usados por pessoas que preferem o sigilo apenas para mandar recado, de olho na reconciliação futura, levando em conta um provável segundo turno, quando os inimigos de hoje tornam-se os aliados de amanhã, ao são noticias inventadas atribuídas às chamadas fontes confidencias, apenas para fazer espuma. Qualquer que seja a hipótese é muito ruim. Admite-se até o off , mas como exceção. Quando vira regra, é preciso olhar com atenção porque com certeza tem alguma coisa de muito errada acontecendo.

10 de Setembro de 2008 08:31

Josias Pires disse...

Quero saudar a iniciativa de Joana Dark e Mônica Bichara que botaram na rede o debate sobre a mídia baiana. Nada mais oportuno e necessário do que refletir sobre a imprensa e as comunicações, isto é tão saudável quanto o ar que se respira, indispensável como as reformas e revoluções que estão em pauta.

Oportuno, sobretudo, trazer à baila o fato de que "lugar de repórter é na rua". Ivana Braga havia se referido a isto no papo sobre assessoria de imprensa das campanhas, que tivemos esta semana na Faculdade da Cidade. Como em outras campanhas, entre os impressos, apenas A Tarde destacou repórteres para acompanhar ocasionalmente cada um dos candidatos. Há um esforço de fazer outras matérias Mas há pouca apuração no campo. É óbvio que as novas tecnologias são ótimos canais para a coleta de informações. Mas a presença ao vivo nos locais onde os fatos são criados é insubstituível.

O que sinto mais falta na cobertura é aprofundar o debate em torno dos problemas e das propostas para a cidade, para além desse universo de "micropautas" que dão conta de aspectos muito fragmentados da nossa realidade social, política, cultural. É a imprensa buscar ir além do dia-a-dia. E por conseqüência é também qualificar o debate eleitoral e é o que interessa à cidade. A imprensa pode e deve contribuir muito para melhor informar os cidadãos sobre o que está em jogo com as eleições.

Neste momento, p. ex., a campanha voltou a ser sacudida pela violência verbal que, no limite, atinge a honra pessoal do candidato que está sendo agredido. A violência verbal é uma das estratégias da campanha do alcaide e, sobretudo, do ministro que o embalou. Foi a retórica utilizada na questão sobre o uso da imagem de Lula, tentando estabelecer um "confronto" entre Pinheiro e Lula. A mesma estratégia agora o pmdb está usando no marketing, atirando contra a honra da pessoa do candidato, uma tentativa de desqualificação pessoal. A violência seduz muitos jornalistas e rapidamente tende a espalhar-se como ondas por blogs, sites e jornais.

A quem interessa rebaixar a campanha eleitoral às agressões verbais? É evidente que ao atingir a honra pessoal a agressão deve ser repelida. Mas não é possível reduzir o debate eleitoral a agressões - as eleições devem ser pedagógicas e a cidade quer saber qual as diferenças políticas entre os candidatos, quais os conteúdos de cada um deles. Ao eleger um candidato como o seu preferido, as pessoas estão transferindo para aquela pessoa os seus próprios desejos de ver as soluções para os problemas.

A disputa atual em Salvador é muito mais difícil do que a da eleição de Wagner, pois agora há quatro candidatos de razoável potencial eleitoral. Para chover no molhado, ganhará a eleição aquele que melhor traduzir os desejos e esperanças da maioria da população de Salvador. Cada passo é, cada vez mais, decisivo até o dia da eleição.


Josias Pires
DRT 1547